Saudade… palavra que muitos consideram genuinamente oriunda do povo brasileiro… mas na verdade não o é… simboliza uma emoção que todos os seres humanos, independente de sua nacionalidade, carregam consigo.

O vocábulo “saudade” deriva do latim, e por isso mesmo, existe em outras línguas românicas. O espanhol tem soledad. O catalão soledat. O sentido, no entanto, não é o do português, está mais próximo da “nostalgia de casa”, a vontade de retornar ao lar.

A autenticidade brasileira foi a ampliação do termo a situações que não só seja evocada como a solidão sentida pela distância do lar, mas apresentando-a como a dor de uma ausência que temos prazer em sentir, pois nos remete a algo que nos marcou, deixou marcas e alimenta nossa memória afetiva.

A área de eventos, sempre alinhada com a dinâmica social, já percebeu o exponencial e rico material que poderá ser trabalhado para promover sua exaltação e até mesmo compensação.

Trata-se portanto, do intitulado Mercado da Saudade. Este nicho de mercado surgiu para suprir a falta de algo não tão mais corriqueiro, ou que a distância afastou, mas que continua presente na memória de muita gente, pois traz aconchego, desperta sentimentos nostálgicos e felizes. Para os organizadores de eventos, o insight é enxergar oportunidade no saudosismo e investir no que desperte essa emoção e atenda a saudade contida na mente e coração.

Esse movimento em sinergia com a globalização contemporânea, tem gerado interesse e práticas que já se contabilizam como um grande alavancador das economias locais.

Para que possamos ter uma ideia do panorama e potencial desse mercado, há um estudo de caso muito interessante, já sistematizado nos Estados Unidos.

De acordo com Itamaraty, a maior parte das micro e pequenas empresas brasileiras no exterior se concentra nos Estados Unidos. São mais de 9 mil iniciativas formais que apostam no mercado da saudade para faturar.

Esse levantamento contabilizou os micro e pequenos empreendedores formais, mas há muitos outros que não entraram na estatística. Apenas nos Estados Unidos, a estimativa é que 48,3 mil brasileiros desenvolvam atividades autônomas informais. Mais brasileiros empreendedores, mais produtos brasileiros no conhecido ‘mercado da saudade’ – que movimentou US$ 50 milhões de dólares em 2017 e aumentou a exportação direta do Brasil aos EUA de produtos como pão de queijo, açaí ou cachaça em 77% em 2016, segundo a Apex. Estados Unidos e Canadá são os principais destinos de produtos brasileiros no mundo.

No Brasil, junho é considerado o mês dos namorados e das festas juninas; e no exterior, tal calendário incita o aquecimento do chamado “mercado da saudade”…E público não falta. Em 2016, por exemplo, o Ministério das Relações Exteriores (MRE) estimava mais de 3 milhões de brasileiros vivendo fora do Brasil.

Mundo a fora já são mais de 20 mil micro e pequenos empreendedores brasileiros formais, de acordo com levantamento mais recente do MRE. A maior parte deles, 9 mil, se concentra nos Estados Unidos. O país norte americano é seguido de Japão, com 1,5 mil, e a França, com 1.320.

Especificamente para atender a esta demanda de novos empreendedores globais, um grupo de brasileiros fundou em Miami, Flórida, um instituto de negócios, o Global Business Institute (GBI), focado em auxiliar em todas as etapas quem vai empreender internacionalmente. Em tempos de tendência da internacionalização de produtos nativos como açaí e tapioca, por exemplo, os especialistas alertam para a importância do investimento assertivo na hora de apostar no nicho “da saudade” no mercado exterior.

“Quando um brasileiro vai para outro país, querer transformar a saudade da terra natal em negócio não significa garantia de sucesso. Mas, sem dúvida, pode ser muito mais assertivo se o empreendedor se apegar à alguns passos fundamentais orientados por profissionais globais que lidam com este mercado. Tem que haver um planejamento para cada tipo de iniciativa”, afirma Manoel Suhet, CEO do GBI.

Depois do Carnaval mundialmente famoso do Brasil, a Festa Junina é a segunda celebração popular mais importante da cultura brasileira. As festas que começaram como uma tradição católica no Brasil, tem o objetivo de criar um grande encontro de dança, bebida e comidas típicas e estão ganhando cada vez mais adeptos também nos Estados Unidos. Em Los Angeles, a festa Junina batizada de ‘Brazil’s Country Festival’ ocorreu no início de junho e contou com a presença de banda brasileira.

As festas juninas já são tradição em diversas cidades americanas onde a comunidade brasileira é mais extensa e mais antiga. Da Flórida ao norte dos Estados Unidos é possível encontrar a realização do evento que conta com a participação maciça da comunidade brasileira e cada vez mais de americanos, o que explicita o poder da Economia Criativa.

“Muito além de reforçarem os laços dentro da comunidade brasileira e aproximar a cultura do Brasil dos americanos, eventos culturais como estes representam um importante cenário sobre o qual os empreendedores mais atentos têm investido muita observação para lucrar. Existem diversos produtos que podem trafegar nos EUA, impulsionados pelo mercado da saudade. É comum que os brasileiros sigam apegados a produtos que consumiam no Brasil, antes da entrada nos Estados Unidos”, afirma Antonio Miranda, Diretor de marketing do Global Business Institute.

Imagine a grandiosidade dessa oportunidade? Vamos pensar de forma inversa… quantas colônias aqui estão, em território verde e amarelo e que anseiam por iniciativas sérias e bem estruturadas que os remetam as suas origens? E o quanto há de público, ávido, por conhecer e vivenciar essas experiências?

Vamos arregaçar as mangas e mergulhar nesse mercado da saudade?

Isso é ter visão e não deixar a inércia ganhar escala e estagnar seu negócio. O Mercado da Saudade fomenta novas oportunidades e prolifera sorrisos para todos os lados, afinal, tem na emoção sua matéria prima mais nobre.

Vamos tornar prática a composição de “Chega de Saudade”, de João Gilberto:

“Chega de saudade, a realidade é que Sem ela não há paz, não há beleza

É só tristeza e a melancolia que não sai de mim . Não sai de mim, não sai.

Mas se ela voltar, se ela voltar… Que coisa linda, que coisa louca…”

ANDRÉA NAKANE